quinta-feira, 18 de junho de 2015

Gratas surpresas

Não amanheci bem naquele dia. Estava me sentindo feia e inchada. Cheia de canos e carrinhos sem fim. Mas o rim transplantado estava perfeitamente funcionando. E eu mentalizava isso para  progredir. Para me ajudar. Para elevar minha auto estima.
Eis que alguém bate na porta. Eu estava sozinha naquele momento.
- Com licença. Como está Carol?
Meu cirurgião...
- Bem...estou cansada, inchada, não tenho apetite. Minhas costas doem de ficar deitada. Não posso sair do quarto, minha imunidade está muito baixa. Tenho saudades Dr.. Da minha casa, minha cama, do meu filho, minha cachorra. Tenho saudades da minha vida. Do meu lar.
A minha auto estima estava péssima.
- Quantos dias fazem que você internou?
- Vinte e dois.
- Por que você não pede uma autorização para seu filho vir te ver?
- Não quero que ele me veja assim Dr.!
- Pois eu acho que vai ficar impressionado sim, mas vai ter uma imagem ainda mais forte da mãe guerreira e lutadora que ele tem. Ele só tem motivos para ter orgulho de você!
E as minhas lágrimas pularam, molharam a minha camisola. Solucei como há tempos não fazia.
- Não vou te dar um abraço porque não posso chegar perto de você. Mas pense no que te disse. E tudo vai dar certo. Acredite.
E se foi. Fechou a porta e levou consigo toda aquela esperança, aquela alegria contagiante, aquele bom humor. 
Meu marido veio para dormir comigo e de manhã acordei um pouco melhor. Já esboçava um sorriso. Tirei a camisola do hospital e coloquei uma camisola azul turquesa. Que eu desenhei e minha costureira fez para mim. Era linda, delicada. Arrumei o cabelo e passei um batom.
Saí do banheiro e meu marido faz aquela pergunta:
- Aonde vai bonita assim?
- Vou deitar na cama e esperar o café. É o que me resta.
E começamos a gargalhar. Da situação. Do meu mal humor (coisa que não me pertence), de eu esperar sempre pela comida. Era a única coisa diferente que acontecia. E esperava também a novela Salve Jorge. Não perdia um minuto do Theo e da Morena. Dois chatos, mas eu torcia por eles. Torço sempre pelo amor no final.
Terminei meu café, coloquei minha máscara e fiquei deitada. Pensei no meu filho novamente. Meu coração sangrava por dentro. E comecei a falar com meu marido sobre a idéia do médico.
E a porta bate:
- Bom dia Carolzinha...nossa aonde vai bonita assim?
Minha médica clínica.
- Ai Dra. eu posso estar tudo, menos bonita.
- Você quer ir para casa?
Aquilo parecia meio surreal, sei lá, demorei para internalizar aquela frase.
- Carol, seus exames já chegaram e está tudo perfeito. Chegou a hora. Você vai voltar para casa.
Dia 10 de novembro de 2012 eu voltei para casa. Não podia abraçar ninguém, muito menos pular, mas estava voltando a ser a Carolina que só eu sei que existe. E isso me fascinava.
Arrumamos tudo. A enfermeira tirou todos os acessórios que enfeitavam meu braço. E partimos.
Na saída do quarto avistei as enfermeiras e chorando, me despedi. Agradeci a todas, mesmo sem poder tocá-las. Sei que sentiram a minha energia.
E voltamos para casa, rumo ao meu refúgio, ao meu lar. 
Pedi no caminho, para meu marido, que quando fosse buscar nosso filho na escola não falasse que eu iria estar em casa. É uma surpresa.
Ele chegou da escola, todo sujo, normal para uma criança de 9 anos. 
-Filho, vamos trocar de roupa e lavar bem o rosto e as mãos, com sabão hein?
- Tá bom pai, mas porquê?
- Você já vai ver.
E eu estava escondida no lavabo da sala, cheia de dor, louca para sentar no sofá. Mas estava feliz. E era isso que importava. Só isso. Nada mais.
Quando ele desceu as escadas, sentou na mesa para almoçar. Minha mãe estava junto. E eu apareci. 
-Mãaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaae!!! Você voltou! Agora nossa família está completa de novo.
Eu não conseguia falar muito, mas meu coração conseguia sentir. A maior alegria da minha vida. Reencontrar quem eu mais amo nessa vida. Alguém que lutou bravamente para nascer no meio do caos. Meu lutador de judô preferido. Palmeirense fanático.
Logo estou nas arquibancadas gritando teu nome.
Orgulho de você filho. De você e da nossa família...
Que quase não cabe dentro de mim.

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